domingo, 8 de junho de 2008

Cara a cara com um javali

Trabalhar como guarda-noturno na Itália não é das tarefas mais difícieis. Comecei essa atividade há uma semana e posso dizer que numa cidade pacata como Numana, em que estatísticas de criminalidade praticamente inexistem, é muito fácil. A situação de perigo mais consolidada até o momento foi que, há dois dias, encontrei um javali na volta pra casa, numa estradinha escura que dos dois lados é cercada por plantações de trigo. O bicho estava se refestelando com o grão quase maduro e pronto para a colheita, e destruindo quase tudo no entorno. Essa é uma das características do comportamento dos javalis: arruínam mais do que comem. Bem que eu vi que naquele terreno as plantas estavam todas acamadas. Pensei que fosse resultado da chuva e dos ventos que solaparam os planos de férias dos italianos uns dias atrás. Mas era obra do bichão. Felizmente ele sentiu mais medo de mim do que eu dele e saiu correndo pela plantação. A princípio pensei que fosse um cachorro, mas quando no escuro pude divisar os contornos avantajados desse porco selvagem me dei conta de que sim, era um javali. Na Amazônia cheguei perto de uma imensa anta, mas nunca pensei que fosse encontrar um javalizão, o que não é de estranhar, pois estou na terra deles e há pelo menos 20 anos deixaram de caçá-los no parque Del Conero, que é como chamam a reserva florestal do Monte del Conero.
Mas voltando ao trabalho de guarda-noturno, no princípio achei que fosse passar por experiências dignas das vividas por Jack Kerouak, que no livro On the Road fez esse bico para se capitalizar e seguir viagem. Bom, se não me engano ele chegou a comprar uma arma, e apaziguar os ânimos de trabalhadores bêbados loucos por confusão. Eu, em vez disso, preciso é lutar contra o sono, de tão monótono. Mas definitivamente não posso me queixar. Primeiro porque consegui um trabalho, direito ao qual os próprios italianos estão sendo privados neste verão de crise. E segundo porque não preciso carregar pedras ou entregar panfletos publicitários, o que exige caminhar por cinco, seis horas seguidas recebendo 30 euros ao dia. Isso sim que é trabalho pesado e mal pago.

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